terça-feira, 7 de outubro de 2014

Eu, você e Frances Ha

Frances Ha é um filme sobre uma vida normal. É aquele filme que você assiste e pensa que sua vida também poderia virar um filme, o que é espetacular! Me incomodou um pouco o fato dele ser em preto e branco e até agora não entendi o propósito dessa decisão, mas esse é um fato que não pesa, até porque gosto de dar lugar ao diferente. O filme relata a vida de Frances, uma menina, aparentemente vinda de uma família com boas condições financeiras, que foi tentar a vida como dançarina em Nova Iorque. Mas Frances não é exatamente o talento em pessoa, ela é o que eu chamaria de uma pessoa diferente e por isso me simpatizei tanto com ela. Se Frances realmente existisse em minha vida, provavelmente não seríamos as melhores amigas, porque eu ainda não sei me relacionar intimamente com pessoas tão diferentes. Esse é um processo que ainda estou iniciando, mas eu ainda teria um grande carinho por ela, principalmente por ela ser autêntica, mesmo sem ser forçar a ser. 
Frances é uma "compreensiva", daquelas que se magoa por algo que a melhor amiga fez, mas continua a amá-la, sem nem pestanejar. Frances às vezes nos faz sentir vergonha alheia quando participa de jantares onde não tem intimidade com os convidados, mas também me faz pensar se não seria bom ser assim: totalmente desligada do que os outros vão pensar ou das convenções formais. Ela é assim: parece não ter muita lógica na vida, parece não viver analisando as situações, parece apenas viver. Ela não faz contas, por isso não conta com o inesperado. Não se desespera em arrumar um namorado, nem fica com o melhor amigo para suprir a carência. E nessa decisão não parece haver mil teorias escondidas, apenas a falta de vontade. Talvez essa seja sua principal característica: Frances é uma mulher de vontades. Não vontades de alguém caprichoso e egoísta, mas vontades simples. Sua solidão, em alguns momentos, me deu pena e as decisões difíceis que ela precisou tomar na vida me fizeram sentir uma enorme empatia. Sentimento de qualquer um que já precisou fazer uma escolha difícil um dia, ou de alguém que sabe como pode ser chato viver sem um sonho. Frances tinha um sonho, mas precisou abrir mão dele. Ainda assim ela seguiu e seguiu adaptando suas vontades e pareceu ser feliz. A vida de Frances poderia ser a minha, a sua, a de qualquer um que tenha vontades. Com vocês, Frances Ha.

Fonte: site Folha de São Paulo

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

A magia dos dados

Eu sou louca por gráficos e análises de dados. Esse é o momento (talvez o único) em que meu lado engenheira fala grita mais alto. E nunca vi uma forma tão interessante de demonstrar dados como nessa palestra do TED. O palestrante foi didático e extremamente criativo, além de abordar um tema de interesse universal: a taxa de natalidade e suas mudanças durante os anos. 

A partir desse vídeo também podemos relembrar um pouco do método científico, que resumidamente consiste em, após observações elaborar e testar hipóteses para compreender se elas eram verdadeiras e tirar conclusões a partir das análises. Estão aí duas coisas que todo mundo deveria aprender, além de ler e escrever: análise e interpretação de dados e método científico.

Hans Rosling é perito nesses assuntos. Nesse vídeo ele demonstra como criou uma hipótese e analisou os dados para definir a veracidade. Nesse caso foi avaliada a relação entre religião e taxa de natalidade e o resultado é surpreendente. No final ele ainda encontra uma maneira bem visual e didática de demonstrar suas conclusões. 
Veja você mesmo.


(Para ver com legendas em português, clique aqui).

Em tempo: Hans Rosling criou um site (gapminder.org) para divulgar estudos e diferentes ferramentas para análise de dados, como o surpreendente software utilizado no estudo apresentado no vídeo. Um dos projetos do gapminder é o Projeto Ignorância, que tem como missão lutar contra a ignorância das pessoas, proporcionando conhecimento estatístico sobre fatos de fácil compreensão. Vale a pena dar uma olhada.

The mission of Gapminder Foundation is to fight devastating ignorance with a fact-based worldview that everyone can understand. We started the Ignorance Project to investigate what the public know and don’t know about basic global patterns and macro-trends. We use surveys to ask representative groups of people simple questions about key-aspects of global development.

Nesse outro link é possível descobrir um pouco mais sobre as razões que o levaram a criar o site e seus projetos: 

http://www.ted.com/talks/hans_rosling_shows_the_best_stats_you_ve_ever_seen?language=pt-br#t-414555

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Porque eu adoro o ESQUENTA

Eu sou uma garota branca, de classe média alta, que estudou em escola particular a vida toda e depois cursou universidade pública e infelizmente quase todos os meus amigos também são assim. E quase todos também odeiam o Esquenta, programa da Regina Casé, transmitido pela Globo, aos domingos. A justificativa comum é que o programa é uma bagunça, mas eu não consigo compreender bem esse justificativa. Pra mim, o programa é uma festa e que festa boa não é uma bagunça? Compreenderia melhor se me dissessem que não gostam das músicas, dos debates, ou que acham as brincadeiras sem graça, mas bagunça não cola, mesmo porque nenhuma dessas pessoas vai em festas e fica quieta sentada na mesa, pelo contrário, elas caem na bagunça. Por essas e outras é que acredito que o problema vai muito além da "bagunça", mas fica no visual. As pessoas que participam do programa são, na sua maioria, negros e nós, brancos que não saímos do nosso mundinho, não estamos acostumados com isso. Por mais absurdo que seja, em um país com o tamanho da população negra que o Brasil tem, aqui branco ainda não está acostumado a estar em um lugar onde há a mesma proporção entre negros e brancos ou onde negros são maioria. 
O que rola no esquenta é uma aula em todos os sentidos. Músicos, intelectuais, ativistas sociais e educadores se misturam para falar sobre os mais variados temas.  Fazem parte do elenco fixo sambistas com Arlindo Cruz, Péricles, Mumuzinho e Leandro Sapucaí. Mas também fazem Alê Youssef e Ronaldo Lemos, os chamados colaboradores de conteúdo, formados em universidades renomadas, que poderiam ser considerados intelectuais, mas também estão no esquenta, ensinando sobre temas diversos,  interagindo com os músicos, com os convidados e com Luane, a menina da favela que ficou famosa por seus vídeos na internet e proporciona algumas das partes mais hilárias do programa. Assim como Douglas Silva, o menino que foi revelado em Cidade de Deus e hoje participa do programa sempre com um grande sorriso no rosto. Também tem vez a Natália, uma deficiente visual que a pouco conseguiu ingressar na universidade e já relatou absurdos casos de preconceito sofrido.
No meio disso tudo tem sempre muito funk, samba, pagode, rock e diversão. Sempre dou boas risadas assistindo e queria estar ali em todas as gravações brincando de roleta musical e dançando, mesmo sem levar jeito para essa arte. Mas além das atrações artísticas e da bancada o programa conta com seus convidados e tem sempre a intenção de transmitir conhecimento para quem está assistindo. Já teve o físico Marcelo Gleiser, a escritora Thalita Rebouças e durante a copa vários cidadãos de outros países, brincando e falando um pouco sobre suas culturas e impressões do Brasil.
Com todos eles eu aprendo muito e relembro alguns conteúdos já estudados, mas aprendo, principalmente, a ser mais tolerante com as diferenças. Aprendi, por exemplo, a respeitar o funk, aprendi a conhecer mais ainda a diversidade brasileira e entendi o lema "Xô preconceito" que não poderia se encaixar melhor em um programa, que é tão taxado injustamente. Eu, que raramente encaro algum preconceito na vida, vejo ali como a vida pode ser dura para algumas pessoas.  
Me alegro em pensar o quanto as pessoas que assistem podem estar aprendendo e se inspirando, como na história do médico que era catador de lixo, e tirou forças dos livros que achava nos lixões para seguir em frente e não se entregar às drogas, ou ainda no relato sobre os meninos de Salvador que quando foram recolhidos por uma ONG tinham os dedos comidos por ratos. Sobre eles Regina assumiu que no primeiro momento não acreditava em uma recuperação, não julgava que crianças e jovens tão sofridos pudessem se recuperar psicologicamente, mas após o trabalho e o amor demonstrado pelas pessoas da ONG a recuperação aconteceu e sobre esse caso a apresentadora falou emocionada, que ninguém tem o direito de desistir de ninguém. Em um dos programas, cujo tema eram os anos 20, falou-se sobre a semana de arte moderna de 1922, assunto eu já havia estudado, mas muitos outros não, e se 10% dos seus telespectadores saiu dali e foi pesquisar na internet algo sobre esse grande acontecimento da nossa história já foi um grande feito.
Sempre gostei de Regina Casé, acho ela autêntica e verdadeira. É uma famosa que realmente se preocupa com as pessoas diferentes dela, que fora das câmeras está na zona norte e em favelas. É alguém que na vida pessoal vive o mesmo que é retratado em seu programa, sem taxações, sem incompreensão. Regina Casé é mistura. É Brasil. Há quem não entenda isso e julgue os seus modos, mas há quem compreenda e aplauda, como Mano Brown, em uma recente entrevista: "Revolução de 2014 é o quê? É Regina Casé, tá ligado? Melhor programa [“Esquenta!”] da televisão brasileira hoje, querendo ou não. O movimento negro vai vomitar quando ler isso. É uma pessoa que vem lutando, vem disputando, vem acompanhando e chega um momento que faz um grande programa de TV, morou? Do jeito que as pessoas são, fazendo o que elas são, vivendo o que elas são. Não tenho vergonha de ninguém ali, tenho orgulho. Eu me vejo em todos eles ali."
Eu estou com Mano Brown. Pra mim, o Esquenta é o melhor programa da TV brasileira. Você pode até não concordar, mas por favor, me dê um argumento sem preconceitos.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

A Legião de Dado

Todo o mundo dizia que Renato Russo era a Legião urbana. Quando ele morreu eu tinha acabado de descobrir a banda. Depois de ser apresentada a Eduardo e Mônica, na escola, por um livro de português. Lembro de ficar parada sem acreditar naquilo quando ouvi a notícia no plantão da globo. Ainda assim alguns anos depois o acústico MTV embalou a viagem de fim de ano da turma do colégio.   No meu aniversário de 15 o presente mais comemorado foi o CD Mais do mesmo e ouvíamos Dezesseis repetidas vezes, intrigados com a história de João Roberto, já na faculdade descobri o que é ter medo de baratas voadoras e recentemente, depois de uma dura perda, fiquei me lembrando que a vida continua e se entregar é uma bobagem. Renato tinha morrido, mas a Legião urbana ainda estava em nossas vidas. Os anos foram passando e eu sempre descobria outras músicas que adorava ou relembrava as velhas. Mas restava um grande pesar: não ter tido a chance de ir a um show. Até que o Dado Villa-lobos esteve em BH.

Fiquei sabendo que o Dado ia cantar em uma pequena casa de shows e resolvi tentar a sorte, pensando que não tinha nada a perder. Não esperava muito, mas o risco também era baixo. Cheguei e vi na tela da bilheteria que haviam sido vendidos menos de 300 ingressos e comecei a pensar que era um fracasso anunciado. Mas Dado me surpreendeu. Ele cantou e tocou e deixou o público cantar com se fosse para milhares de pessoas e eu me emocionei como se Renato Russo e Marcelo Bonfá estivessem ali. Foi maravilhoso ter companhia para cantar e gritar todas as letras da adolescência e por alguns momentos achei que eu fosse até chorar! :) Dado foi lindo, cantou músicas da carreira solo, mas a maioria foi da Legião, falou sobre a vida, sobre o filho e no final até se sujeitou a dividir o palco com um cover do Renato, que pulava por todos os lados do palco, derrubando instrumentos. Um pouco antes desse cover entrar algumas pessoas começaram a gritar o nome do rapaz, como se não fosse importante o Dado ali, outras gritavam coisas histéricas e o atrapalhavam. Visivelmente descontente Dado até disse algumas palavras, pedindo que as pessoas esperassem pela entrada do Renato fake, mas continuou seu show maravilhosamente e no final eu só queria lhe dar um abraço e agradece-lo por, mesmo sem precisar, continuar fazendo aquilo, por me dar a oportunidade de viver esse sonho, que eu nem imaginava mais que fosse possível. 


domingo, 31 de agosto de 2014

EU MAIOR


Um documentário brasileiro, viabilizado por centenas de doações no crowdfunding e incentivos fiscais., distribuído gratuitamente na internet, pode ser encontrado no youtube ou no site do projeto (http://www.eumaior.com.br/). O objetivo, segundo os idealizadores, é gerar uma reflexão sobre auto-conhecimento e felicidade, e pra mim, aí está o primeiro grande acerto do projeto. Dois pontos que nem sempre são tratados ao mesmo tempo aqui estão constantemente relacionados. Nos levando a analisar o impacto de um no outro. Afinal, como buscar a felicidade sem antes perseguir o auto-conhecimento? Impossível. Se não entendemos o que nos faz felizes, esse estado de espírito nunca chegará de uma maneira consciente em nossas vidas. Talvez por não perceberem essa correlação muitas pessoas menosprezam esse auto-conhecimento ou não encararem a dificuldade relacionada à jornada. Algo que deveria ser simples - se conhecer, entender suas vontades e prioridades - é, na verdade, extremamente complexo. Principalmente nos dias de hoje, onde temos inúmeras opções, entender quais são nossas reais expectativas e o que realmente nos faz felizes é um desafio imenso. Soma-se a isso o fato de toda a exposição gerada em redes sociais e de como a vida das pessoas parece mais fácil e melhor que a nossa e a ideia imposta de que precisamos de bens materiais e status sociais para sermos felizes e pronto. Gera-se uma boa mistura para dificultar o caminho para a felicidade, seja ela profissional ou pessoal. 

Para discutir esse assunto EU MAIOR entrevista dezenas de pessoas, dos mais variados tipos e nos enche de perguntas. Questionamentos que devemos fazer diariamente para nos entender. Por volta dos 11 minutos e 30 segundos vem o meu primeiro baque, com a pergunta de uma entrevistada, professora de vedanta, que ao refletir sofre a constante insatisfação humana calmamente indaga: "Nada realmente me preenche. De que eu estou sofrendo?". Um pouco mais a frente uma monja fala sobre mudança e sobre aceitar o sofrimento. "A tristeza é importante. Todo mundo quer renascer, mas ninguém quer morrer. Emoções são rápidas. O resto é memória e a gente fica chamando elas." Mais ou menos nos diz: e então! Ninguém está imune ao sofrimento, cabe a cada um resolver como lidará com ele. Ficará chamando toda hora ou vai levantar e crescer com isso. Não que a prática seja tão simples quanto à teoria, mas é mais ou menos isso. Se dói, não lembre. Saia dos lugares que te fazem lembrar, fuja das coisas, procure e encontre métodos, sempre que possível.  E algo comum a muitos entrevistados é a busca pela evolução, de filósofos, a cientistas, passando por líderes  espirituais, artistas e esportistas, vários relatam a importância da evolução, de não parar de pensar e melhorar, constatam que nunca chegaremos lá, que a vida é uma eterna evolução. Mário Sérgio Cortella cita a frase de um pensado inglês, que diz: "A vida é muito curta para ser pequena" e caracteriza como pequena a futilidade e banalidade. O viver sem engrandecer a nós mesmos e aos que nos rodeam. Marina Silva comenta que a maior qualidade que um ser humano pode ter é "saber-se pequeno, saber-se falho e incompleto". E vem de onde menos se esperava, do cientista Marcelo Gleiser, a constatação de que o ser humano não pode saber de tudo. Um estudioso, que assume a nossa impotência. "O que importa é o que a gente quer saber e não responder todas as perguntas."

Ainda assim EU MAIOR simplifica a vida. Não dá nenhuma resposta, como realmente tinha de ser, quando não existe verdade universal, mas a verdade de cada um. Por isso o documentário apresenta muitas perguntas e te convida a pensar em você, a refletir sua vida e suas escolhas. Te mostra que as coisas podem ser mais fáceis, desde que haja entrega e busca. Eu maior é cheio de paradoxos, é complexo, mas simplifica, é do imaginário, mas é real, é duro, mas é sensível. Obrigada aos idealizadores do projeto e a todos que doaram, fazendo com que sua construção fosse possível.

Em tempo: esse assunto também me fez lembrar desse texto abaixo, que tem a ver com felicidade no trabalho. Vale a pena a leitura:

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Antonio. Nu, de botas.


Ganhei o Antonio Prata de presente. Na verdade, ganhei seu livro, mas foi como se eu tivesse ganhado um amigo. Aquele que te conta histórias engraçadas na mesa de um bar e arranca lágrimas dos seus olhos, de tanto rir. E depois disso ele ainda te deixa essas histórias para contar para os seus outros amigos e permitir lágrimas misturadas a risadas e dores de barriga por longos períodos.

E assim foi, Antonio Prata me contou suas histórias de infância e me fez querer compartilha-las com todos os meus amigos, mais que isso, me fez querer dar seu livro a todos os meus amigos, pois tenho a consciência que o seu jeito de contar as histórias é muito melhor que o meu. Passei uma semana só falando dele, fiquei feliz quando a primeira amiga convidou para o aniversário e eu já tinha o presente certo para dar. E dupliquei de felicidade quando ela disse que estava adorando o livro, mesmo sabendo que não tinha como não gostar.

Com sua visão infantil, de quem está descobrindo o mundo, Antonio não nos poupa de suas análises daquele tempo, como quando descobre que, apesar de terem a mesma planta, nem todas as casas eram ocupadas da mesma forma que a sua e nos confidencia: 

"na casa do Henrique, por exemplo, a televisão estava onde deveria ficar a mesa de jantar, a mesa de jantar onde deveria estar o sofá, o quarto dele era onde, lá em casa, ficava o quarto dos meus pais e vice-versa. Sem falar na casa do Rodrigo, onde os pratos era azuis. Como poderiam não saber que os pratos são brancos? 
Tinha pena dos outros, hereges, vivendo errado."

E por aí vai, a vida na vila, os amigos, a separação dos pais. Histórias de crianças, que geralmente ouvimos dos adultos agora são contadas pela ótica do pequeno ser. Crianças me encantam e com Antonio não foi diferente. A cada conto ele vai ficando melhor e após a metade do livro, só tinha o que rir daquela criança e de suas histórias e comecei a achar que Gregório Duvivier havia exagerado um pouco quando relatou que havia chorado com esse livro. Pensei: está tudo tão leve e engraçado, não vai acontecer de chorar. Foi quando me deparei com Sorvete e bala. E chorei. Chorei porque me vi naquelas crianças, chorei porque tinha aquele medo de perder os pais muito cedo, mesmo não me lembrando de, naquela idade, ter tido conversas tão profundas com meus pais, me lembro do sentimento. Com esse texto, Sorvete e Bala, o mesmo Mário, pai de Antonio, que me deixou perplexa e me fez rir alto com seu comportamento em Blowing in the wind (que já havia sido publicado e pode ser lido aqui) agora me emocionava e encantava. Antonio explica: 

"Meu pai nunca entendeu que eu e minha irmã não tínhamos a mesma idade que ele. Isso não se restringia a nós nem mudou com o tempo: até hoje ele conversa com uma criança de três anos de igual para igual, o que faz com que elas o adorem." 

Não sou mais criança, mas também adoro o pai de Antonio, mesmo entendendo a posição contrária da mãe com relação à sua extrema honestidade para com os filhos. 

quarta-feira, 23 de julho de 2014

O segredo dos seus olhos


Tem coisas que não conseguimos esconder: o que os olhos dizem e nossas paixões são alguns exemplos. Os olhos revelam sentimentos, desejos e até mesmo culpados. Eles brilham por paixão, lacrimejam por tristeza e perseguem os caminhos dos desejados pelos donos desses olhares, podendo ser captados por qualquer testemunha. As paixões não são lógicas, elas existem e muitas vezes podem até mesmo ser chamadas de obsessão. É por causa dessas duas características, dos olhares e das paixões, que o investigador policial Benjamín Espósito consegue desvendar o brutal assassinato de Liliana Colloto, uma linda professora, vinda do interior para Buenos Aires, e esposa de Ricardo.
Assim como Espósito, seu personagem principal, O segredo dos seus olhos é de uma sensibilidade gigantesca e nos envolve mais a cada nova cena.  Nos indignamos com o crime e com o sistema penal Argentino. Criamos compaixão por Ricardo, que perde a esposa de uma forma tão inesperada, e por Benjamìn, com sua vida amorosa conturbada. Torcemos intensamente para que o criminoso seja capturado, para que Ricardo reconstrua sua vida e tenha um pouco de conforto em seu coração, para que os corruptos funcionários da polícia se dêem muito mal e finalmente para que o amor do investigador por Irene (sua chefe no tribunal) ganhe vida fora de seu coração. 
Mesmo contanto uma história tão profunda e comovente o filme não nos gera uma tensão desconfortável, pelo contrário, consegue grandes momentos de humor, especialmente com a participação de Pablo Sandoval, o parceiro de Benjamìn. Os detalhes e as cenas lentas, onde as imagens muitas vezes valem mais que os diálogos, fazem de O segredo dos seus olhos o melhor filme que assisti nos últimos anos. Indicação para todos os tipos de gostos, sem erro. Por isso, te aconselho: permita-se descobrir O segredo dos seus olhos.

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Socorro

Acho que todo mundo já desejou, pelo menos uma vez na vida, não sentir nada!
Nunca consegui esse feito, mas toda vez que pego frustrada por isso lembro dessa música e do desespero que parece ser não sentir nada... Arnaldo Antunes já sabia e ensinou.

"Socorro alguém me dê um coração, que esse já não bate nem apanha
Por favor uma emoção pequena, QUALQUER COISA
Qualquer coisa que se sinta
Tem tanto sentimento deve ter algum que sirva."



 E pra quem gostou também vale a pena ouvir as versões de Gal Costa e Cássia Eller.


terça-feira, 17 de junho de 2014

Porque devemos aprender a falhar


Não sei se foi diferente em outras em tempos anteriores às redes sociais. Mas sei que em tempos de intagrans e facebooks falhar não é algo que passa pela vida das pessoas, ou pelo menos não é apresentado aos "amigos". Parece uma disputa por quem faz a melhor viagem, tem os melhores amigos ou o maior sucesso profissional. Não há espaço para o fracasso, mesmo sabendo que ninguém está livre dele. 

E por causa disso que me preocupa muito o modo como estamos levando a nossa vida e ensinando nossas crianças. O fracasso faz parte do cotidiano e é preciso aprender a lidar com ele para que possamos comemorar os sucessos. É disso que fala o excepcional livro: O andar do bêbado. Nele, o autor, Leonardo Mlodinov, descreve o papel do acaso em nossas vidas. Utilizando-se de conceitos estatísticos, mesclados com senso de humor e casos reais extremamente interessantes o livro tenta mostrar ao leitor que a maioria das coisas na vida não pode ser prevista e os acontecimentos não têm uma relação direta com nossas habilidades ou "predestinação". Ou seja, que o nosso futuro é tão certo quanto o próximo passo de um bêbado. Essa afirmação assusta muita gente. Muita gente que acredita ter as rédeas de sua própria vida e outros que colocam tudo na conta do destino e do "estava escrito que seria assim". No final das contas nenhum dos dois grupos fala do acaso ou está preparado para aceitar o incontrolável e geralmente lida com as falhas de modo frustrante. Ou para de tentar com medo de falhar novamente ou para porque acredita que aquilo "não era para ser". Mas o que Mlodinov nos apresenta não é bem assim. Nas palavras do próprio autor:

"Pode parecer assustadora a ideia de que o esforço e o acaso, tanto quanto o talento inato, são o que realmente importa. No entanto, eu a considero estimulante, pois, enquanto nossa constituição genética está fora do nosso controle, o grau de esforço depende de nós mesmos. E os efeitos do acaso também podem ser controlados, na medida em que, dedicando-nos a tentativas repetidas, podemos aumentar nossa chance de êxito."

É esse o princípio: muita coisa nas nossas vidas não vai sair da maneira como desejamos, pois o acaso, (que dependendo da sua participação também pode ser chamado de sorte, ou azar) vai cumprir o seu papel e não adianta espernearmos quanto a isso. Por isso, se você quer muito uma coisa aprenda a falhar, aprenda a se levantar após cada tombo e continuar correndo atrás, pois raramente a primeira tentativa será bem sucedida e quanto mais você tentar mais chance terá de conquistar o desejado. E nem é preciso entender muito de estatística para saber disso. Pois até Raul Seixas já dizia: tente outra vez!



quarta-feira, 7 de maio de 2014

A vida dos outros



Sabe aqueles filmes que acabam e você fica uns minutos paralisada pensando sobre ele? Assim é A Vida dos Outros.  E no meu caso foram bem mais que alguns minutos. fiquei dias pensando sobre o filme e em como ele é forte.
Passando-se na Alemanha, quando dividida entre oriental e ocidental, o filme retrata um investigador (Wiesler) que está espionando a vida de um casal, já que o governo julga que eles deviam ser espionados, por talvez serem contra o regime, o que era inadmissível naquela época. No decorrer da investigação a vida do casal começa a impactar na vida do próprio investigador e alterar suas perspectivas.
Parece que Wiesler nunca tinha visto as outras opções, nunca tinha percebido a vida além de suas convicções e que as pessoas que não concordavam com o regime que ele seguia poderiam ser boas pessoas. Acredito que foi o amor daquele casal que alterou as perspectivas de Wiesler, foi a relação sofrida, mas ao mesmo tempo altruísta. Foi a capacidade de perdoar e de questionar. Foi a capacidade de amar que lhe mostrou um novo caminho além da opressão e da punição. 
O desenrolar do filme me fez lembrar de Hannah Arendt. A filósofa alemã que escreveu sobre a banalidade do mal. Quando ouvi o argumento pelo primeira vez achei que era impossível o que ela dizia, mas A vida dos Outros me fez perceber que talvez seja sim possível que pessoas que cometeram grandes males por seus superiores na verdade não entendessem o que estavam fazendo. Após ver as mudanças que aconteceram na vida de Wiesler e no seu comportamento acho que entendi o que Hannah queria dizer. Uma pessoa que antes fazia tudo pelo seu governo, punia pessoas que não concordavam com o regime e era implacável com "traidores"  foi capaz de mudar quando conheceu outras pessoas e acompanhou de perto suas vidas. Wiesler até então não conhecia outra verdade, apenas a sua, aquela que seus superiores lhe ofereciam. E o que ele queria era fazer um bom trabalho. O casal espionado abriu seus olhos e lhe mostrou uma nova opção. Uma alternativa que Wiesler preferiu e abraçou, até mesmo em detrimento da sua profissão.    

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

New York, New York


Bom... devo admitir que eu tinha um grande preconceito com os EUA e relutei muito a tornar o país como uma das minhas prioridades de viagem. Mas como mudar de ideia é sinal de que pensamos, depois de estudar mais e ver quantas pessoas interessantes amam NY resolvi ir tirar minhas próprias conclusões.

Nesse post não vou falar dos passeios excelentes mas óbvios, como: Central Park, Times Square, Memorial 11 de setembro, Visitar a loja da M&M, Grand Central, Empire State, Rockfeller Center ou sobre os vários museus da cidade. Mas vou tentar falar sobre as coisas diferentes...

Quando decidi ir pra NY comecei a arrecadar um monte de dicas, pois vários amigos já tinham ido e como eles me passaram também as dicas que receberam quando percebi estavam com uma pilha de dicas e visto que eu tinha vários dias acabei fazendo muita coisa e perdendo muito também. A lição que tirei disso tudo é que a primeiro coisa que você deve fazer ao pedir/seguir dicas é descobrir se o viajante tem gostos parecidos com os seus. Isso parece óbvio, mas até então eu não tinha me atentado para isso (talvez por ter sido a primeira vez em que arrecadei tantas dicas). Só fui entender essa dinâmica depois de ter perdido muito tempo procurando uma loja (não me julgue, normal em NY), que de acordo com a dica era imperdível e ter ficado super decepcionada ao chegar! Mas valeu muito eu ter precisado disso para chegar a minha conclusão! hehe Então pra você saber se pode confiar nas minhas dicas, vai lá um pequeno perfil: não sou ligada a marcas, mesmo sabendo que elas podem até durar mais não compro coisas caríssimas. Estou sempre fazendo relações de custo benefício (exageradamente, até). Adoro programas culturais e andar pela cidade um pouco sem rumo e mudando os planos de vez em quando. Morro de preguiça da caça ao tesouro e de traçar o caminho mínimo nas viagens. Aquele momento em que você chega, marca no mapa tudo o que é importante e tenta traçar a menor rota. Se estou viajando é pra curtir a cidade e tentar conhecer um pouco da vida das pessoas ali. Sem desespero! E ainda levar várias coisinhas para minha vida! Hehe Por isso, culpa zero ao entrar em várias lojas! 

Cheguei em NY dia 31 de dezembro de 2012, já com o ingresso da festa de ano novo comprado, pois quase todo mundo sabe que passar ano novo na rua em NY é a maior furada. Frio, muita gente, e nada de especial. O que a gente não sabia é que enfrentaria uma fila de quase 4 horas (que literalmente rodeava um dos grandes quarteirões de NY) para pegar os ingressos da nossa festa. Aí você me pergunta: por que não mandaram entregar? Não foi avareza, é que esse serviço era mesmo indisponível para cartões de crédito que não fossem americanos. Então esse foi meu primeiro choque (ou quebra de paradigma): americanos não são extremamente organizados, americanos furam fila e também deixam coisas para última hora, tal como nós, brasileiros. Mas ao mesmo tempo os americanos de NY tem um transporte público eficiente e que funciona muito bem. Saímos do aeroporto sem precisar pegar taxi, com muita facilidade nos dirigimos ao metrô e a partir dali chega-se em qualquer lugar que um turista queira ficar na cidade. Estávamos em uma ilha dentro da ilha de Manhattan e havia duas opções para chegar: o metrô ou o tram (uma espécie de bondinho). E isso facilitou muito a vida pré e pós horas de fila.

Mas voltando à festa de ano novo, ela não foi boa. Foi barata, se comparada aos padrões brasileiros (mas pode ser um barato que sai caro, quando você se vê obrigado a deixar tips-gorjeta -  para cada bebida que pega). O lugar não era adequado (parecia um hotel onde vários andares estavam separados para a festa, mas todos muito pequenos). Não tinha comida (o que não ficava claro no ingresso) e a música também não era lá essas coisas. Já que estávamos ali nos divertimos, mas não recomendaria, pelo menos não essa festa; Porém recomendo muito NY nessa época do ano. Com várias pistas de patinação no gelo, ainda toda enfeitada e iluminada a cidade fica linda e o meu medo do frio passou rápido, ao ver toda a beleza da cidade. Porém não peguei nenhuma nevasca, como a que aconteceu em 2013. E além disso, recomendo outras coisinhas.




Fiz e foi demais:

The Ride - A propaganda diz que é o melhor show da Broadway e depois de participar acreditei nisso. Dentro de um ônibus que passei pelos principais pontos da cidade os apresentadores vão contando histórias da cidade, interagem com um elenco da rua e com a platéia que está dentro do ônibus. Muito engraçado e divertido. Vale a pena demais. 



Jogo de Basquete: impressionante entrar no estádio, sentir o clima e assistir ao espetáculo que é tanto o jogo quanto os intervalos. Tudo aquilo que a gente vê nos filmes!

Ir no Brooklin: um bairro charmoso e bem diferente da outra parte da cidade. Sem contar que a vista é muito bonita.

BB King: entrei por falta de opção e com um certo preconceito, pois pela localização achei que era um lugar só para turistas. Mas que grata surpresa! O clima do restaurante é ótimo. A música, ao vivo, era de excelente qualidade (Miami Cake & Donuts) e a comida também.

Shack-schack - sanduíche muito bom, que faz valer a pena enfrentar o frio na fila que geralmente percorre o lado de fora.

Max Brenner - Fui pro brunch e até hoje ainda sonho com esse waffle aí de baixo. Se eu tivesse só algumas horas em NY é o doce que eu iria comer.



The Place - restaurante no Soho. Romantico, lindo, e comida deliciosa. Mas teria $$$$ nos guias. Estripulias também fazem parte da viagem e achar um restaurante charmoso que ninguém havia indicado também faz.


Carmines - Restaurante Italiano lotado de turistas, mas tem pratos muito bons, gigantes e preços camaradas. A localização é perfeita para quem está saindo tarde de um show na Broadway.

Pret a manger - paradinha pro lanche ou pra café da manhã. Sanduíches deliciosos com uma proposta super bacana: tudo que não é vendido no mesmo dia é doado aos sem teto.

Fiz e arrependo:

China Town: Praticamente toda cidade Cosmopolita tem uma China Town e a de NY é a pior em que já estive. Feia e suja, fiquei lá apenas algumas horas e desesperada para ir embora. Há quem diga que é lugar obrigatório para quem quer comprar bolsas falsificadas, mas realmente não era o meu foco. Segue uma amostra do que pode ser encontrado:




Lojinhas:

Bed & Bath & Beyond: apelidamos de BBB e essa loja realmente nos deixou loucos, pena (ou sorte) que muita coisa que a gente fica com vontade de comprar é grande e inviável de ser transportada. Meu bolso agradeceu.
TJMax: o paraíso dos perfumes. Achei alguns a preços inacreditáveis.
Century 21: muito falada e faz juz à fama, mas fiquei um pouco desesperada lá dentro, devido às inúmeras opções.
Conway: achei apenas um pequeno site falando dessa lojinha, mas dizia maravilhas sobre elas, ao meu gosto (roupas extremamente baratas) e que duram muito pelo custo. Ou seja: na cabeça da engenheira aqui o custo-benefício altíssimo vez os olhos brilharem! Essa foi também uma luta para achar, mas valeu muuito a pena! Tem coisas horrorosas também e a minha primeira impressão me vez querer sair correndo, mas depois de garimpar fiz ótimas aquisições, como: calças para bater, blusinhas e casaquinhos. (diga-se de passagem o site é muito melhor que a loja física) hehe
Aldo: excelente para sapatos (principalmente masculinos e bolsas).
H&M: dispensa comentários. Eu tenho quase que um vício por essa loja e no fim o namorado já estava mudando os caminhos, pois percebeu que não consigo passar na frente sem ter a compulsão por entrar.
Model Sports: achei que era brincadeira os preços dessa loja. Tudo muito barato, o que nos faz levar bem mais do que precisamos e do que precisamos e do que caiba nas malas!


Ficou pra próxima:

Alguns dos passeios pelo Harley, para ir nas igrejas.
Assistir uma peça de teatro
Comer no Etaly


O fato de deixar alguma coisa pra próxima em NY não é um problema, já que NYC não se visita apenas uma vez. E não marcar todos os itens da listinha de uma vez só dá uma sensação de quero mais. E que seja logo essa próxima visita! :)

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Duas vezes Bethânia

Na economia tem uma teoria que se chama teoria da utilidade e ela diz mais ou menos o seguinte:
a primeira coisa que você consegue é sempre mais importante (mais útil) que o segundo item idêntico e eu acho que isso também se encaixa quando falamos de experiências vividas, isto é, a primeira experiência é a mais marcante, é melhor. Acredito tanto nisso que já deixei de fazer algumas coisas para preservar a minha primeira impressão, isso porque o primeiro show do Chico Buarque, foi muito melhor que o segundo e o do Lulu também. Teatro Mágico e Fernando Sorocaba não foram diferentes. Mas sobre o Paul eu não quis reduzir o encanto e fui ver o ex-beatle apenas uma vez, já que aquela vez foi tão especial e a sensação ainda estava em mim quando surgiu a oportunidade de vê-lo novamente. Mas à Bethânia eu não pude resistir.

No primeiro show ela me deixou sem palavras. Me deixou arrepiada e sorrindo sem saber porque quando com aquela voz marcante e uma interpretação sublime no palco ecoava letras e versos incríveis, com certeza escolhidos a dedo.

Encheu meus olhos d'àgua quando entoou que era o vento que sopra a areia do Saara sobre os automóveis de Roma e em um reconvexo levou a pláteia ao ápice ao deixar por nossa conta o verso que falava de Dona Canô ("Quem nunca rezou a novena de Dona Canô").

No segundo show confesso que a magia e a emoção não foram as mesmas do primeiro, mas cantei o que eu não sabia cantar antes e me ENcantei outra vez. Isso porque Bethânia recita poemas, Bethânia fala de amor, fala de amor pela profissão, fala de amor pela música, de amor pelo outro. Bethânia é ridícula.

Afinal...

Todas as cartas de amor são ridículas, mas ridículo mesmo é quem nunca escreveu uma carta de amor.
É quem nunca ficou em um estado de poesia, onde chega tem vez que a pessoa que namora, se pega e chora do que ontem mesmo ria. Ridículos não percebem que não falta nada, cadeira, sofá, parede, cama, só falta alguém pra sentar, pra deitar, pra acordar. Ridículos nunca saíram feridos, sufocando seus gemidos no corpo na alma e no coração. Ridículos são aqueles que dissimulam, disfarçam e escondem o que não dá pra ocultar. Ridículo é quem não vive e quem tem a vergonha de ser feliz.

Fernando Pessoa, Gonzaguinha, Roberto Carlos, Arnaldo Antunes, Pedro Abrunhosa, Milton, Caetano e Bethânia, todos tão ridículos quanto as cartas de amor. Para a nossa sorte!!

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

A Justiça, por Michael Sandel


Meu livro do ano é esse aí: Justiça. E digo do ano porque vergonhosamente, foi a única leitura que iniciei (e ainda não terminei), após a trilogia dos 50 tons, lida durante as férias de janeiro.



Conheci o autor, Michael Sandel, durante uma palestra que assisti em São Paulo. Professor de Harvard, Michael tem, sem dúvida alguma, o dom da oratória. Deixou mais de 500 jovens entusiasmados e loucos para participar. E mesmo sendo um evento logo após o almoço, em um dia quente da capital paulista, não havia sequer uma pessoa cochilando. Seu estilo consiste em apresentar um tema, geralmente controverso e perguntar a opinião da platéia. que levanta as mãos divindo-se entre aqueles que concordam o exposto e os que não.  Depois Michael pede que uma pessoa de cada grupo explique suas razões. Pronto: a lição está dada. A partir das explicações Michael vai puxando o novelo e nos fazendo pensar e colocando mais e mais questões... Seu objetivo não é trazer respostas, mas sim perguntas, tais como: você acha que é certo ter ingressos que permitam furar filas em parques de diversões? Você concorda com a prática realizada pelos cambistas? No fim seu objetivo era discutir a sociedade em que estamos vivendo onde tudo tem um preço.

E seu livro não é diferente. Em Justiça Michael trata sobre as diversas maneiras como a justiça, a ética e os valores são interpretados e ilustra com várias situações (a maioria real) onde as diferentes formas aparecem. Aqui vou contar apenas uma, provavelmente com alguns detalhes errados, mas a essência correta:

Durante a busca por Osama Bin Laden 4 soldados estavam escondidos atrás de um colina no Afeganistão, avaliando um acampamento, quando surgiram dois pastores trazendo suas ovelhas. Diante daquela situação os soldados tinham duas opções: deixá-los partir e continuar suas jornada ou matá-los (considerando que se partissem o esconderijo dos soldados corria perigo). O texto deixa bem claro que não havia um terceira opção, como deixá-los presos durante um período de tempo. Após muito discutirem, um voto em favor de deixá-los partir, um para matá-los e um abstenção coube ao comandante decidir o destino dos dois pastores e ele optou por deixá-los ir. Acontece que horas depois os 4 soldados se viram cercados por homens armados e uma sangrenta batalha começou. Durante a batalha 3 morreram e um helicóptero que tentava resgatá-los também foi abatido, resultando na morte de outros 16 soldados. O único sobrevivente foi o comandante da missão (que havia decidido o destino). Após o desencadear dos fatos o comandante só tem uma certeza: de que tomou a decisão errada ao liberar os pastores e que se um caso semelhante acontecesse novamente ele não hesitaria em matar os civis.

E então, como mensuramos o valor da vida humana? As 19 vidas perdidas valiam mais que as vidas dos 2 pastores? É justo matar pessoas inocentes? Quais parâmetors são considerados para tomar uma decisão como essa? Frustrante ou não o livro não dá essas respostas, mas te convida a pensar e pensar é necessário.