quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Duas vezes Bethânia

Na economia tem uma teoria que se chama teoria da utilidade e ela diz mais ou menos o seguinte:
a primeira coisa que você consegue é sempre mais importante (mais útil) que o segundo item idêntico e eu acho que isso também se encaixa quando falamos de experiências vividas, isto é, a primeira experiência é a mais marcante, é melhor. Acredito tanto nisso que já deixei de fazer algumas coisas para preservar a minha primeira impressão, isso porque o primeiro show do Chico Buarque, foi muito melhor que o segundo e o do Lulu também. Teatro Mágico e Fernando Sorocaba não foram diferentes. Mas sobre o Paul eu não quis reduzir o encanto e fui ver o ex-beatle apenas uma vez, já que aquela vez foi tão especial e a sensação ainda estava em mim quando surgiu a oportunidade de vê-lo novamente. Mas à Bethânia eu não pude resistir.

No primeiro show ela me deixou sem palavras. Me deixou arrepiada e sorrindo sem saber porque quando com aquela voz marcante e uma interpretação sublime no palco ecoava letras e versos incríveis, com certeza escolhidos a dedo.

Encheu meus olhos d'àgua quando entoou que era o vento que sopra a areia do Saara sobre os automóveis de Roma e em um reconvexo levou a pláteia ao ápice ao deixar por nossa conta o verso que falava de Dona Canô ("Quem nunca rezou a novena de Dona Canô").

No segundo show confesso que a magia e a emoção não foram as mesmas do primeiro, mas cantei o que eu não sabia cantar antes e me ENcantei outra vez. Isso porque Bethânia recita poemas, Bethânia fala de amor, fala de amor pela profissão, fala de amor pela música, de amor pelo outro. Bethânia é ridícula.

Afinal...

Todas as cartas de amor são ridículas, mas ridículo mesmo é quem nunca escreveu uma carta de amor.
É quem nunca ficou em um estado de poesia, onde chega tem vez que a pessoa que namora, se pega e chora do que ontem mesmo ria. Ridículos não percebem que não falta nada, cadeira, sofá, parede, cama, só falta alguém pra sentar, pra deitar, pra acordar. Ridículos nunca saíram feridos, sufocando seus gemidos no corpo na alma e no coração. Ridículos são aqueles que dissimulam, disfarçam e escondem o que não dá pra ocultar. Ridículo é quem não vive e quem tem a vergonha de ser feliz.

Fernando Pessoa, Gonzaguinha, Roberto Carlos, Arnaldo Antunes, Pedro Abrunhosa, Milton, Caetano e Bethânia, todos tão ridículos quanto as cartas de amor. Para a nossa sorte!!

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

A Justiça, por Michael Sandel


Meu livro do ano é esse aí: Justiça. E digo do ano porque vergonhosamente, foi a única leitura que iniciei (e ainda não terminei), após a trilogia dos 50 tons, lida durante as férias de janeiro.



Conheci o autor, Michael Sandel, durante uma palestra que assisti em São Paulo. Professor de Harvard, Michael tem, sem dúvida alguma, o dom da oratória. Deixou mais de 500 jovens entusiasmados e loucos para participar. E mesmo sendo um evento logo após o almoço, em um dia quente da capital paulista, não havia sequer uma pessoa cochilando. Seu estilo consiste em apresentar um tema, geralmente controverso e perguntar a opinião da platéia. que levanta as mãos divindo-se entre aqueles que concordam o exposto e os que não.  Depois Michael pede que uma pessoa de cada grupo explique suas razões. Pronto: a lição está dada. A partir das explicações Michael vai puxando o novelo e nos fazendo pensar e colocando mais e mais questões... Seu objetivo não é trazer respostas, mas sim perguntas, tais como: você acha que é certo ter ingressos que permitam furar filas em parques de diversões? Você concorda com a prática realizada pelos cambistas? No fim seu objetivo era discutir a sociedade em que estamos vivendo onde tudo tem um preço.

E seu livro não é diferente. Em Justiça Michael trata sobre as diversas maneiras como a justiça, a ética e os valores são interpretados e ilustra com várias situações (a maioria real) onde as diferentes formas aparecem. Aqui vou contar apenas uma, provavelmente com alguns detalhes errados, mas a essência correta:

Durante a busca por Osama Bin Laden 4 soldados estavam escondidos atrás de um colina no Afeganistão, avaliando um acampamento, quando surgiram dois pastores trazendo suas ovelhas. Diante daquela situação os soldados tinham duas opções: deixá-los partir e continuar suas jornada ou matá-los (considerando que se partissem o esconderijo dos soldados corria perigo). O texto deixa bem claro que não havia um terceira opção, como deixá-los presos durante um período de tempo. Após muito discutirem, um voto em favor de deixá-los partir, um para matá-los e um abstenção coube ao comandante decidir o destino dos dois pastores e ele optou por deixá-los ir. Acontece que horas depois os 4 soldados se viram cercados por homens armados e uma sangrenta batalha começou. Durante a batalha 3 morreram e um helicóptero que tentava resgatá-los também foi abatido, resultando na morte de outros 16 soldados. O único sobrevivente foi o comandante da missão (que havia decidido o destino). Após o desencadear dos fatos o comandante só tem uma certeza: de que tomou a decisão errada ao liberar os pastores e que se um caso semelhante acontecesse novamente ele não hesitaria em matar os civis.

E então, como mensuramos o valor da vida humana? As 19 vidas perdidas valiam mais que as vidas dos 2 pastores? É justo matar pessoas inocentes? Quais parâmetors são considerados para tomar uma decisão como essa? Frustrante ou não o livro não dá essas respostas, mas te convida a pensar e pensar é necessário.